quinta-feira, 19 de junho de 2014

Esquerda x direita é isso ?



 Paraisópolis, São Paulo, Brasil


 “(...) de um lado estão aqueles que consideram que os homens são mais iguais que desiguais, de outro os que consideram que são mais desiguais que iguais”. 
Norberto BOBBIO, Direita e esquerda, 2001, p. 121. 


Esquerda e direita não são apenas os dois lados de uma mesma moeda. A diferença entre ricos e pobres não se expressa na dicotomia política esquerda/direita. Se assim fosse a imagem acima seria apenas uma imagem de algum filme de ficção, uma vez que seria impossível a existência,  num regime democrático, de um espaço tão contrastante em termos econômicos, dada a maioria daqueles que estão do lado esquerdo do muro.

Em tempos de copa, de hino cantado a plenos pulmões, de vaias e palavrões, de borrachadas e gás pimenta, alguns mandando "tomar no c..." e outros dizendo que isso faz parte da "elite branca paulistana", certos conceitos políticos fundamentais começam a se confundir e a se relativizar ao sabor das paixões, principalmente nas redes sociais, que já provaram sua influência política não só aqui como em outras partes do mundo.Enfim,o que significa realmente esquerda e direita na política ?Quem é de esquerda e quem é de direita ?
Ser de direita ou de esquerda não significa apenas estar na direita ou na esquerda segundo uma atribuição de valores puramente econômica: ricos são de direita e pobres são de esquerda. A opção política não se define apenas pela condição econômica do indivíduo. O fato de ter ou não ter capital não significa ser ou não ser de esquerda ou de direita.
Contrariando o senso comum, muitos daqueles “que tem” são de esquerda. Engels era filho de industrial. Sua opção política não era racional, baseada na herança do capital paterno mas sim emocional, tocada pela angústia que lhe causava a condição subumana que os capitalistas, como seu pai, imprimiam aos trabalhadores da Inglaterra do séc. XIX.
De forma semelhante - e paradoxal, posto que inexplicável do ponto de vista racional - muitos daqueles “que não tem” são de direita. E defendem sua opção política com muita fé, paixão e consciência. A cada eleição, muitos representantes políticos de direita são eleitos e reeleitos - inclusive para os cargos do executivo. Como isso é possível se a maioria dos eleitores é composta por aqueles “que não tem”  e portanto “deveriam” ser de esquerda ?  
A resposta à essa pergunta por parte daqueles da esquerda (e principalmente por aqueles da esquerda “que tem”) seria simplesmente a afirmação de que o povo não sabe votar. Já por parte daqueles da direita (“que tem”) essa resposta seria simplesmente a afirmação de que o povo (aqueles que “não tem” e optaram por ser de direita) dá a sua resposta nas urnas à bandalheira, à corrupção e ao desgoverno de uma ex-esquerda "traidora", que agora "tem", e muito !.
Enfim, será que nós - tanto faz se da esquerda ou da direita, desde que tenhamos a firme convicção de não aceitar respostas prontas - podemos nos contentar apenas com as respostas e argumentos baseados no senso comum, tanto daqueles de direita quanto daqueles de esquerda ?.
“De esquerda” são aqueles que consideram e buscam a igualdade social entre os homens, aqueles que valorizam a cooperação, a solidariedade, a comunidade, a coletividade e a defesa dos direitos humanos e das minorias. “De direita” são aqueles que justificam a desigualdade social pela meritocracia, pelo esforço individual, pelas habilidades desenvolvidas, pela competência técnica e abominam a perda de tempo, a ociosidade, a "preguiça"; de direita são aqueles valorizam a competição, a individualidade e a intolerância ao erro. Ou seja, é fácil reconhecer quem é de direita e quem é de esquerda...   
Portanto, se a diferença entre esquerda e direita se resumisse apenas à diferença entre ricos e pobres, a imagem acima seria apenas a de um filme de ficção. Se a maioria dos indivíduos de classe baixa fossem de esquerda, mesmo que todos os ricos fossem de direita, não existiriam mais favelas (e nem mansões). Nessa situação hipotética, a maioria do povo, ao eleger seus representantes da esquerda para todos os governos em todos os níveis, levaria ao fim (ou ao menos a uma drástica diminuição) da desigualdade aqui no país mais desigual do mundo. Nesse caso, uma imagem como essa, em tese, deixaria de existir. Mas isso é apenas uma conjectura. O que é fato é que nem todo rico é de direita e, principalmente – e é preciso que tenhamos a consciência disso - a maioria dos indivíduos de classe baixa e média baixa também são de direita, por convicção.