domingo, 13 de julho de 2014

A ética protestante e o espírito do futebol

 



Com o título mundial conquistado pela equipe de futebol da Alemanha nessa Copa do Mundo da FIFA de 2014 aqui no Brasil, em pleno Maracanã, fica evidente que apenas um jogador excepcional não é garantia de sucesso num jogo coletivo como o futebol. O último bola de ouro da FIFA que levantou a taça do mundo foi o nosso baixinho Romário em 1994. Cristiano Ronaldo foi embora muito cedo dessa copa e Messi lutou até o final, mas o eficiente time alemão provou que futebol é eficiência, organização, empenho, treino e trabalho em equipe, com tudo o que isso representa.
Esperemos que agora o público entenda que o verdadeiro futebol não é feito de manhas, de malandragens, de craques que se juntam a cada quatro anos como se fosse um rachão; que não é feito de holofotes, nem de contratos publicitários milionários e nem de cabelos pintados, bigodes estilizados ou bundas redondinhas. O futebol de hoje é feito de trabalho, empenho, abnegação, planejamento e principalmente, humildade para se trabalhar em equipe.
A consagrada eficiência germânica suplantou no futebol o vigor passional dos hermanos argentinos, e de todos os latinos, inclusive dos europeus com tradição cultural latina, como a Espanha, Portugal, Itália e França, que ficaram pelo caminho.
Segundo Max Weber, o grande sociólogo alemão (!) em sua clássica obra “A ética protestante e o espírito do capitalismo”, trabalho, empenho, planejamento e abnegação fazem parte da ética protestante, pois são as condições fundamentais para o desenvolvimento desse sistema econômico que hoje domina o planeta. Já a ética católica, uma ética da paixão (sofrimento), da sorte (fortuna), do herói excepcional messiânico e mítico (Cristo) e, principalmente do mea culpa, ou da prática de "oferecer a outra face" não é adequada ao pleno desenvolvimento de um sistema onde a competição, a eficiência e a maximização da produtividade são seus fundamentos.  
Autores modernos buscam explicar o sucesso estadunidense no plano capitalista - que destoa de todos os outros países americanos ex-colônias - a partir de outro ponto de vista que não seja aquele clássico "colônia de exploração/colônia de povoamento". O caminho de Weber é adequado para ampliar essa discussão pois os EUA são um país essencialmente protestante em oposição a todos os demais países (católicos) das Américas, alguns inclusive em estado deplorável econômica e socialmente, cuja explicação para suas misérias não se sustentam apenas na teoria do imperialismo. O fracasso de Che Guevara na Bolívia só reforça a fraqueza dessa tese determinista.
Mas isso já é outra história. Afinal, quem pode negar que hoje, mais do que nunca, o futebol representa o próprio capitalismo ? O futebol de alto nível está inserido em um ambiente altamente competitivo, que movimenta bilhões de dólares, que produz atletas de alta performance, que tem por trás uma imensidão de profissionais altamente especializados, que tem um objetivo simples e claro: ser a melhor equipe para poder ganhar o jogo e o campeonato. O futebol hoje é o símbolo máximo do capitalismo globalizado.
Tanto Brasil quanto Argentina - dois dos principais países católicos do mundo; um o maior país católico do planeta, o outro, a terra do próprio Papa  - caíram sob os pés de dois dos principais países protestantes do globo; países que se rebelaram à tirania católica das indulgências, onde se originaram a Reforma Protestante de Lutero e Calvino: a Holanda, que é um pequeno conjunto de terras construídas sobre o mar e que dominou o comércio marítimo europeu no início da era moderna e a Alemanha, o país sem saída para o mar que desafiou o resto do mundo por duas vezes.  
Sem querer ser herege (?), pode-se afirmar hoje que a ética protestante pode perfeitamente ser aplicada ao espírito do futebol da atualidade. Nesse sentido, podemos tentar explicar aquilo que parece não ter explicação nessa Copa do Mundo, principalmente para nós, brasileiros, latinos e católicos, que observamos atônitos tanto a Alemanha quanto a Holanda - sim, pois 3 a 0 também é goleada, ainda que ofuscada pelo vexame avassalador da blitzpanzer - ensacarem um Brasil chorão e prostrado de joelhos, oferecendo a outra face e agradecendo não se sabe o que ao misericordioso Salvador. 
Entramos em uma nova era. Para quem conseguir ler nas entrelinhas desta Copa, deve compreender que é o fim da era dos solitários bolas de ouro da FIFA e o início da era de um novo futebol, um futebol verdadeiramente de equipe, da eficiência, que enterra definitivamente o já inexistente - ainda que muitos saudosistas tentem ressuscitá-lo "futebol arte"; é um futebol mais do que nunca alinhado à ética capitalista e portanto à a ética protestante. 
Enfim, se quisermos ser hexacampeões devemos ser menos católicos e mais calvinistas. Com tudo o que isso representa e significa.
E para finalizar: parabéns Alemanha pelo título mundial conquistado no templo do futebol na Copa no Brasil, o país mais católico do mundo... por enquanto.        

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