sábado, 5 de julho de 2014

A raposa e o galinho ou mais um pouco de estória sobre a lance Zuniga x Neymar

Parece fábula de Esopo mas é somente o produto de minhas reflexões sobre a polêmica do momento: Zuniga quis quebrar Neymar ? Zuniga foi maldoso ? Zuniga deveria ser punido mais severamente que Suárez ? Por que o juiz não expulsou Zuniga ?

Sendo declarado hoje o inimigo número 1 dos brasileiros nas redes sociais, atacado por todos os lados, jurado de morte pelos mais afoitos e até mesmo tendo sua filhinha como alvo de ofensas imbecis (e criminosas) no facebook, Zuniga declara que não teve a intenção de machucar Neymar.
Os campeões Ricardo Rocha e Luizão concordam que houve uma fatalidade, que houve falta sim, mas não má intenção do colombiano. Outros atletas, companheiros de ofício de Zuniga, que jogam com ele – ou contra ele - no futebol europeu (Zuniga joga no Napoli) afirmam que ele jamais teria intenção de machucar Neymar. A opinião de que houve culpa, mas não dolo por parte de Zuniga no lance que levou Neymar pro hospital é compartilhada pelo belga Mertens, pelo argentino Higuaín, por Lavezzi (ex-Napoli, hoje PSG) e muitos outros jogadores profissionais de alto nível do futebol europeu.
Antes de comentarmos o lance polêmico, vamos considerar alguns fatos:
1)                 O futebol profissional vem se tornando cada vez mais rápido, com cada vez mais contato e os atletas são cada vez maiores e mais fortes. O jogo torna-se obviamente, cada vez mais violento. Isso é fato.
2)                 Todo atleta de alto nível (que joga no futebol europeu) é grande e forte ou então torna-se grande e forte em função dos necessários treinamentos intensos e suplementos para atingir o padrão de alto rendimento requerido pela modalidade atualmente. Lembre-se por exemplo de como era a estrutura física do Ronaldinho, do Robinho ou do Ronaldo Fenômeno ANTES de irem pra Europa. Isso é fato.
3)                 Mesmo já troncudos, jogando na Europa, velozes e com suas habilidades elevadas à potência máxima possível dadas pelas suas condições físicas, esses três superatletas citados tiveram lesões graves que deixaram seqüelas profundas em suas condições físicas, diminuindo seus altos rendimentos esportivos e de alguma forma impondo certos limites às suas carreiras. Isso é fato.    
4)                 Neymar é um garoto bom de bola (assim como eram Ronaldo, Ronaldinho e Robinho). Mas ele é mais que apenas isso: Neymar é um bom menino. É o bom moço. Essa imagem é caríssima hoje para o marketing global do mundo da bola que, afinal de contas, é aquilo que sustenta o “circo do futebol”. Isso é fato.
5)                 Essa seria a Copa do Neymar. O próprio Fred declarou isso ANTES de começar a Copa e em várias ocasiões durante este Mundial. Diz que Neymar é o grande nome desta Copa, que toda a equipe vai dar o suporte para que Neymar desequilibre, etc. Fred é atacante. E até agora não fez absolutamente nada. E Felipão não tira ele do time. Toda bola parada, todo pênalti é o Neymar quem bate pra que se torne artilheiro e portanto, destaque na “Copa das Copas”. Mas quando a coisa apertou no jogo contra a Colômbia (1x1) e o fantasma da desclassificação rondou o gramado brasileiro, surgiu uma falta redentora perto da grande área. Não deu outra: coloca o David Luiz pra chutar. Todos sabem que ele é especialista nisso. Ele mesmo declarou que ficou o ano todo treinando falta no Chelsea. Foi lá, bateu e... é gol ! Brasil classificado. Tudo ok. Fatos e mais fatos.
6)                 A venda de Neymar foi a maior transação comercial entre clubes da história do futebol. Neymar é a aposta da FIFA, CBF e de todo o mercado do futebol para ser o próximo bola de ouro, consolidando a “Era Neymar” e ampliando assim, com mais um player o portfólio de mega investimentos em merchandising do setor, hoje restrito ao Cristiano Ronaldo e Messi. Fatos...
7)                 Neymar pode ser um craque, mas ainda não está fisicamente preparado para disputar um campeonato de alto nível no futebol que se joga atualmente no planeta FIFA. Não basta ser craque, tem que ser craque e um touro. Ele vem treinando muito no Barcelona e desde que chegou lá não é muito utilizado pelo treinador que prefere explorar mais o experiente (e taludo) Messi. Assim foi com o Ronaldinho e com o Ronaldo quando chegaram por lá. Em pouco tempo estavam fortes como um touro e fizeram o que fizeram em suas brilhantes carreiras. Neymar é um grande craque, tem potencial para ser o melhor do mundo durante muito tempo, mas ainda não está pronto fisicamente nem amadurecido taticamente para o futebol de alto rendimento que se pratica hoje. Ainda lhe falta experiência internacional para encarar uma Copa. Ainda mais pra tentar ser destaque em uma. Fatos, fatos, fatos.
8)                 No jogo Brasil x Colômbia, houve uma falta no qual a câmera focalizou em slow motion as travas da chuteira do zagueiro colombiano afundando na parte externa do joelho esquerdo do Hulk. Eu, que tenho dois parafusos no ligamento do meu joelho direito (por causa do abençoado futebol de churrasco) pensei na hora: “ai ! estourou o joelho do Hulk”. Qual não foi minha surpresa quando vi que o nosso monstro do bumbum que causa frisson nas raparigas se levantava mancando só um pouquinho e dali a pouco estava correndo como um cervo pelo gramado. Ou seja, se esse lance tivesse sido aplicado no joelho do Neymar - e não na massa muscular que envolve o joelho do Hulk - fatalmente o nosso atual galinho estaria no hospital, mas com remendos nos ligamentos e não com imobilização de coluna. Isso é fato.       

Conclusão (a única conclusão possível): Neymar não poderia estar jogando esta Copa. Foi exigido muito desse garoto em função de gigantescos interesses comerciais globais. E esses interesses só existem por causa da existência de uma insana ânsia pela conquista de um hexa, de um caneco, de mais uma estrela na camisa... mas isso já é assunto pra outro artigo, algo como: Por que o futebol é o que é; quais as motivações psicossociais que sustentam o mega circo global da bola.    


Bem, agora se analisarmos “futebolisticamente” o vídeo do lance, sem as paixões que porventura possam nublar nossa percepção e coerência, facilmente chegaremos às seguintes conclusões:

        
1)                 Neymar se coloca de frente pra uma bola descendente e completamente de costas pra um adversário que obviamente vem dividir a bola com ele. Não estamos falando de um lançamento, mas de uma bola espirrada, com tempo pros jogadores de ambos os lados se posicionarem pra dividi-la. Enfim, é claro que a bola será dividida, estamos numa Copa do Mundo e não numa pelada entre amigos. E não se divide bola alta no chão. Qualquer um sabe que tem que pular e dividir lá em cima. Isso é fato. Conclusão: primeiro erro do Neymar, que denota falta de experiência em futebol de alto rendimento e alto nível.   
2)                 Neymar pára no instante anterior ao tempo da bola para se colocar e “matar” a bola no peito (ou joelho). Ele não “sobe” pra dividir uma bola que tem que subir; todos sobem, um se apoiando no adversário pra enfim “dividir” o lance e sair ganhando, na força e no grito. Além disso, ele pára, sem olhar pra trás (sem dar luz de freio...) de costas, na frente de um adversário que vem dividir uma bola descendente (dividir no alto, é claro) em um jogo de Copa do Mundo. Ou seja, ele não sobe a fim de esperar a bola cair no seu pé – como se ninguém estivesse ali pra disputar essa bola com ele – e o que é pior, ele pára seu movimento no instante anterior ao choque pra se colocar no tempo da bola (tempo da bola no chão) a fim de dominá-la. Enfim, não dá pra querer fazer isso nem na pelada do churrasco entre amigos lá no sítio da Tia Geralda. Conclusão: segundo erro do Neymar, que denota falta de experiência em futebol de alto rendimento e alto nível.   
3)                 Zuniga chega na velocidade e sobe pra dividir a bola no alto. Mas Neymar não sobe, e ainda pára de costas na frente do “trem” que chega com tudo por trás, subindo e se apoiando no adversário. Reparem que Zuniga olha pra cima (pra bola) até o instante do toque e que a “paradinha” do Neymar na verdade coloca a coluna deste no raio de ação do joelho daquele, que já estava no alto. Reparem que ele está olhando pra cima até então e que, após o inevitável choque ele olha pro Neymar bem abaixo e tira o joelho das costas do colega.    

Enfim, procurando responder as perguntas do início deste texto, veja se você concorda caro leitor: Zuniga cometeu falta, mas não teve intenção de machucar Neymar. Tem culpa, mas não tem dolo. Zuniga não foi maldoso, ele só é um bom jogador de alto nível: tem habilidade, técnica, velocidade e força. Se assim não fosse, não seria um profissional contratado a preço de ouro por um time de primeira linha como o Nápoli e não seria convocado pela seleção colombiana para defender sua bandeira no Mundial. Zuniga não é maldoso, o futebol de hoje é que é um tanto “maldoso”, por ser mais violento. A questão é: por que o futebol de hoje é mais violento ? A resposta deveria considerar uma outra pergunta: Por que o MMA faz mais sucesso que o boxe hoje em dia ? Será que é porque nós queremos ver mais suor, mais garra e  mais sangue ?... mas isso é um tema pra outra reflexão.  Enfim, Zuniga deveria ser punido sim senhor, mas deveria ser punido no jogo, por causa do lance no jogo, pelas regras do jogo; deveria levar um cartão amarelo ou até mesmo ser expulso. Mas não foi. Portanto, não tem sentido puni-lo agora. A punição nesse caso só se explicaria pelo motivo infundado racionalmente – mas não psicossocialmente – de compensação do sentimento coletivo de perda (de nosso maior craque e, por conseguinte, das chances de conquista do hexa). Atentemos para o fato de que esse é o mesmo fenômeno psicossocial que por exemplo, leva uma comunidade pacata de donas de casa a lincharem até a morte um suspeito de um crime qualquer.  

Zuniga errou. Mas errou por não ter considerado o adversário como sendo um “café com leite”, um galinho ainda no forno, em preparação. Errou (?) por considerá-lo um jogador profissional, com condições de participar daquela disputa de alto nível e alto rendimento; um ambiente que pressupõe não só a habilidade (coisa que o Neymar tem de sobra) mas também técnica, velocidade, força e experiência. Afinal, isso é Copa do Mundo, o jogo é esse, é assim que se joga. A brincadeira é de gente grande; grande, forte e experiente, três qualidades que (ainda) faltam ao brilhante e simpático Neymar.


Quanto ao juiz, lamentável arbitragem. O verdadeiro culpado por esse jogo ter tomado proporções de guerra e enfrentamento físico. Na véspera Felipão dizia que temia menos a Colômbia que o Chile pois não havia rivalidade entre as duas seleções assim como há entre Brasil e Argentina, Uruguai ou Chile que o jogo transcorreira como sendo um jogo e não uma guerra. Infelizmente não foi o que aconteceu, o que nos custou uma importante baixa nas trincheiras para as próxias batalhas. Mas vamos fazer um esforço de tentar compreender os juízes que apitam contra o Brasil como sendo conservadores ao extremo, cuidadosos e até mesmo medrosos. Com a repercussão das insinuações nas redes sociais após o pênalti “roubado” para o Brasil no jogo de  abertura da Copa pelo mesmo juiz que já “estava nos devendo uma”, os juízes tem medo de apitar a favor do Brasil e assim contribuir para uma possível conquista brasileira no Mundial, corroborando, dessa forma, a esdrúxula tese de que a Copa foi comprada. Portanto, quanto a essa questão de péssima arbitragem, creio que vamos ter que nos acostumar até o fim da competição, mesmo que o fim, para nós, nação desfalcada e sensivelmente chorosa (ou chorona), seja nesta terça-feira, dia 08/07 na peleja contra os insensíveis e robóticos alemães.      

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